sexta-feira, 27 de maio de 2016

corpos-mulheres [ainda] colônias

ser mulher
n'ato primeiro fundação do brasil
é servir depósito a tais que brancos chegados nas velas

travessia - kalunga
negritude mulheres a cruzar mar
aportando [a contragosto] terrares de cá

encontro homem macho que vem
já em fórceps
na forca forçando
formato não seu

[ é crime,
só que
nem nem
percebeu
- ou hein? ]

resulta
 construção deste que brasil
fruto de estupros nossos corpos mulheres
- sucessivos
- imparáveis
- mais que trinta
- até dias hoje

[ quantos anos de idos se foram mesmo? ]

ato
...contínuo...
formação de um país
pois que colônia
ainda é tempo vigente



domingo, 22 de maio de 2016

[ convoque ]

[ duas versões ]


meu buda tá convocado
- plácido -
- contemplativo -

mas nestes tempos sombrios
- de golpes-baques-dias -
tô convocando mesmo
é um xangô bem irado



meu buda tá convocado

mas nestes tempos sombrios
tô convocando mesmo
é um xangô bem irado



quinta-feira, 5 de maio de 2016

[ r e v o l v e r ]

no fecha-abre de cílios
um instante bastou
na retomada d'um alembrar das antigas

enxerguei foi eu mesma
perdida de inteira
na bolinha negrume

aparição da imagem-semelhança
sem nem descontar
o que de causa indiferença

foi que preciso penetrar profundo
no que é brilho dos glóbulos
pra saber que nem sempre
a gente escapa da profundidão

digo
- das oralidades -
que não posso morar
nestes seus olhos enquanto
eles forem saudades

seus olhos perdidos no imenso das buscas
demandando
descampados sem fins

[ o que se avista aos longes
nem sempre ocorre de se alcançar
com as caminhadas ]

antes que fossem lembranças
-rastros soltos
respingando de tempos em tempos-
acumulando histórico 
pra essas gentes ter o que contar lá na frente

das parecenças que memórias
o que basta em todo
- e eu estou sim é falando do que é sempre -
é ser registro de contrapelos
emparelhado em antecedências

no fundo,
- mas, ora -
é essa gente buscamos
reconstrução fragmentária
do que é origem mesmo



terça-feira, 3 de maio de 2016

PARA [É VERBO E TAMBÉM DEDICATÓRIA: LUANA(S) BARBOSA(S)]



É queda
corpo mais um
couraça humana desfalecida
- espancada -
- humilhada -
- arroxeada no baque
interrompida a vida
precarizada existência
é só mais uma

[ importa? ]

É queda
que é brusca,
que é rombo,
que é grado,
que é soco-soca,
cassetada-cassetete,
d'instinto do ódio,
distintivo pm,
no peito colete,
no pé é a bota,
de um lado porrete,
do outro é armado.

a mesma matéria que carrega esta composição farda
também é massa capaz de receber golpe
no entanto escolha de ação é poder
e neste momento
o que esta massa-farda vê na frente
é mulher
é negra
é lésbica

[ sapatão, importa? ]

- já é suspeita em viver
padrões de gênero que não correspondem
ó
ó
ó
olha bem,
parece o que nomeiam homem
-foi revistada que nem homem
precisou foi implorar
-não me toque, polícia homem
-precisou levantar a blusa
-não sou homem, olha

desce, soca, bate, espalma
Luana gritando -para
filho gritando -para
vizinhança gritando -para
bocas gritando -para

e essa máquina violência-assassinato-preto
que não para
essa máquina arquitetada-estado
que não passa
essa máquina que tem nome
que é polícia
é só desgraça

essa máquina não graça
que tantas vidas despedaça

Luana Barbosa, assassinada pela polícia militar de Ribeirão Preto em 13 de abril de 2016,
presente, presente, presente
assim como Luana Barbosa, de Presidente Prudente,
assassinada com um tiro pela pm durante uma blitz, em 27 de junho de 2014, um dia após completar 25 anos de idade.

Não - nunca - esqueceremos.


vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=DFEqYoNwac4