quinta-feira, 26 de março de 2015

vidas não valem - 1. love

de love chamava a si próprio
comprou anel noivado
trabalhou dia-inteirinho
final noite metrô-trem
descarrilhou embrulhanel
deitou trilhos só-sorriso
noivou morte
benzadeus



segunda-feira, 23 de março de 2015

CORTÁZAR NOITE

acordou meio da noite com frase-prosa de Cortázar incrustada. tentou retomar sono - bate/volta frase firme. não teve outra. saída da cama, busca estante livros-letras. Cortázar despenca prateleirabaixo caindo à tona chão-da-sala úmidoutono. recolhe apressada. receia que molhe a substância concreta das frases, que mofam as palavras, que se percam os pontos no escorrer do líquido aminiótico da umidade-reptila. recupera a tempo tal bestiário; momentos antes do líquido vermelho-vinho atingir livro naquela sala com os resquícios do ontem.
abre folhas, procura frase-prosa sonambular. desliza dedos revezando intensidades. caça - alheia - palavras como quem pula amarelinha. do incrustado da frase buscada encontra outras no trajeto não permitindo a seus olhos pouso livre. estanca. perde-se em sinédoques. funde-se em cronopifâmias.
já bem manhã toda ela ainda sala. perdeu tempo do sono noite. corpóreo intenso deitado úmido. cabeça frases-prosas do novo.
noites sequências não dorme mais.


domingo, 15 de março de 2015

ENCONTRO COM O SAGRADO - MARIA BETHÂNIA



foto: Gustavo Dalle Vedove

Olhar harpia
fina película protetora
travestindo o que em mim habita
por além d'as entranhas
[ desconhecenças todas minhas ]
tal qual camadas transpostas em águas correntes
líquidos fluídos
                    em cachoeirinhas mirins

dona Maria d'esplendor d'Oxum
despenca sobre minha pele
raios-jatos d'Iansã
comanda a brisa revolta
por vezes atacada em quedas
a guiar-me por onde seguir

Eu, Bárbara
nome-ventre da matriarca-avó
- mulher d'efeitos,
mulher cantiga -

Eu, Bárbara
Sincretizando a dona do raio e do vento
com santa católica,
homônima minha

O para si tocar
despencado nas delicadezas
e poesias necessárias para o fluxo contínuo
O para si tocar
não o si enquanto pronome oblíquo
mas sim tal si como o que é SE
e todas nós alterando vozes no silêncio do que se ouve.


Nesta noite o sentimento é de mais intensa gratidão.
"Gratidão por me fortalecer, por fazer com que eu me conheça, por me oferecer um conhecimento de um Brasil profundo"

Abraçar e agradecer - 15/03/2015

Bethânia encerra:
-Cinqueeenta anos de carreira.
-Cinqueeeenta.
-TEM QUE SER MULHER!


terça-feira, 10 de março de 2015

BATEU PANELIN, FOI SENHOR?

Bateu panelin, foi senhor?
Tocou no cabo-madeira
com colher de pau da feira
da janela na Pompeia
ou na Vila Madalena

foi?

Beijou a mãe pela manhã
com flores desejou feliz dia
mulheres internacionais
- mulheres mansas,
mulheres lisas,
mulheres brancas,
delgadas cozidas -
- como bem quero, homem que sou

Trepou com a esposa
lambuzando chocolate
deixou os filhos com a babá vestida branco-uniformizante
-pra que se a velha não tem mãe?
- pra que se abortou foi todos filhos?
- pra que vai querer folga?
- pra que

Comeu risoto quentinho
pelas mãos da mulher preta
na panela inox prime
revestida antiaderente

lambeu beiços bicos brancos
flores para a
                          professora da filha
                                          escola particular
- amante, claro, porque sou homem, doutor - 

telemensagem para a garota vizinha

Final noite
liga barraco mulher-doméstica

-Dona Zefa, onde guarda as panelas aqui de casa?

Dona Zefa, extremo-sul
nem ouvindo de alto ligação
panelas todas
cisternamente
recolhendo
águas das chuvas


sexta-feira, 6 de março de 2015

EM MIM EU CHEGO NO É FUTURO

crédito: Bianca Bittencourt

Em mim
                         eu chego no É futuro
não no agora
- neste É presente -
instante que nem tanto exato
mas pulso vivo d'inspirar-pulmão

                                      momento corpo mística
ressignificado
pré-sente a parábola
do querer/não querer-nos

Chego em mim no ato-próximo
d'instante meu dissimulado
no que não quis
meu É passado
- partiu desapercebido 
                                          nem foi nem não notado -
estado trans-ritualístico

quer-queira
quer-queira-não
no futuro meu eu encaixa
lá chega a léguas
que não minguadas
a passos largos
cheganças vivas