armaram para nós todo um esquema perverso
de exílio na Sicília
mas éramos Safo
e em ilha flutuamos
festaram alegrias querendo nascente varão
"nada falso, nada artificial"
mas éramos Greta Garbo em Rainha Cristina
e da coroa abdicamos
excluíram nosso voto
republicano-democracia
mas éramos Jane Addams
com militantes sufragistas
expulsaram-nos
- também -
do movimento feminista
mas éramos Rita Mae Brown
exigindo aceitação
retiraram de nós
instrumentos possíveis
mas éramos Audre Lorde
e já sabíamos que as ferramentas do senhor
nunca vão desmantelar a casa grande
impuseram em nós
padrão beleza hegemônico
mas éramos Zanele Muholi
foto-focando-nos em primeiro plano
planejaram para nós
subserviência escravocrata
mas éramos Ellen Oléria
bradando minha cons tchi tchi
cons tchi tchi
consciência negra
desejaram para nós
nossas vidas todas desmanteladas
jogadas na vala
enterradas na fossa
mas éramos Maria Bethânia
que qualquer brisa verga
mas nenhuma espada corta
legislaram para nós
toda uma constituição de recato do lar
toda uma constituição de recato do lar
mas éramos Cássia Eller
avessas às feminilidades
performando nossos corpos
nossos gostos
bem-estares
performando nossos corpos
nossos gostos
bem-estares
oraram para nós
nos mantermos trancafiadas
presas celas
arcabouços
mas éramos o que hoje nos tornamos
beijando quem bem queira
em plena praça pública
historicizaram de nós
como sendo inexistentes
apagadas as trajetórias
eliminadas as vivências
mas somos nós mesmas
aqui
agora
a contrapelo
a contrapelo
construindo narrativas
trazendo à tona
todas estas que nos antecederam
buscaram amputar em nós a potência da fala,
nos impondo silêncio
mas somos eu mesma
- Bárbara Esmenia -
abrindo a boca
abrindo a boca
soltando poesia
eco-alto pra tudo quanto é canto
nos quiseram invisíveis
mas nós
- lésbicas -
sempre fomos história
eco-alto pra tudo quanto é canto
nos quiseram invisíveis
mas nós
- lésbicas -
sempre fomos história