De repente, como quem acorda em um jazigo, assustadoramente brotou na sola de meus pés uma lasca de amor.
Doía. Eu não queria.
Era quase que impossível continuar a caminhar pelas trilhas deste mundo com aquela lasca marcando sua presença a cada toque de meu pé esquerdo pelos diferentes tipos de solo.
A primeira atitude imediata foi cutucar com uma agulha, de modo com que a lasca escapulisse para fora.
Não deu outra: como quem se encolhe com dedos coceguentos na barriga, aquela farpa de madeira se meteu mais para dentro, quase que se acobertando com a fina camada de pele que a envolvia.
Sem muito o que fazer, fui convivendo com aquilo.
Aos poucos, a sensação de incômodo foi deixando de aperceber-se e eu quase que não a notava. Eram dias atrás de horas seguidas de cronos de aprendizagem da convivência com o desconhecido.
Deixei-o instalar-se naquela que era a minha sola e o que era uma angústia inicial, tornou-se, ao final, um nem-aí despercebido.
Sorrateiramente aprendi a lidar com o amor e ele, aquietado em seu buraco, manteve-se ali, tranquilo, no mais intricado de minha pele a lembrar-me de sua condição atávica: era ele para sempre, uma fagulha de eternidade, até que, por fim, a morte viesse e secasse o fio de sangue que corria por minha sola.
Nenhum comentário:
Postar um comentário