-CENA
1: Pai, após almoço preparado-servido-e-tudo lavado pela mulher
“está conosco há tanto tempo que já é da família”, dirige a
palavra a seu filho caçula, Pedro.
Mandou
compras cigarros com o motorista da família.
Para
o pai, aquilo fazia sentido, pois queria dar um certo ar de autonomia
ao adolescente sempre protegido.
-Pois
que compre tu, seu-seu-seu-seu...
[o
xingo pichado no muro da garganta.
Quis
gritar milhões de letras amontoadas.
Não
se lembrou se V de vaia é sibilante ou fricativa.
Foi
procurar no grande dicionário atualizado na biblioteca da casa.
Caminhou
longos corredores até chegar à imensa sala.
Ali,
tantos eram os livros que resolveu buscar outros meios.
Pegou
seu iphone último lançamento,
acessou
a internet,
digitou
sua questão.
-Ah,
mas é claro!]
Voltou
para gritar com a consciência de estar seguindo corretamente a
gramática;
sem
violentá-la;
transgredi-la;
rasurá-la;
rememorando
as boas aulas comportado na carteira do colégio branco
particular.
"V-labiodental-fricativa,
repita comigo, Pedro Henrique"
Na
sala de estar, em frente ao pai para gritar, antes que a letra
consciente escapasse de seus lábios, pode ver pela janela a filhinha
mais nova da mulher “já é da família” sozinha, pequenina,
apertando firme o dinheiro na mão direita, subindo a rua em silêncio
a caminho do bar.
(nova versão do Quanto Vale? - escrito publicado em 23/06/2014)
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