quarta-feira, 19 de junho de 2013

OS DESLOCAMENTOS DE FOCO E AS INCONGRUÊNCIAS DA MANIFESTAÇÃO DE ONTEM, 18/06/2013, EM SP

Sem muito dissertar, quero apenas deixar registrado as ações que me fizeram repensar quem é esta galera que está indo para as ruas e se estamos fortalecendo ou correndo riscos de uma emboscada direitista.

1. BANDEIRAS E CARAS PINTADAS
Não somos nacionalistas. Nossa luta ultrapassa fronteiras e nos identificamos com trabalhadorxs de todo o mundo.

2. HINO NACIONAL
Ai gente, aí não né? Já analisaram esta letra? Além do que seu histórico está ligado a todo a direita e sua exaltação da pátria, às forças militares, à obrigação de cantarmos na escola quando éramos crianças, a um louvor inexistente em tempos atuais.

3. "SOU BRASILEIRO COM MUITO ORGULHO, COM MUITO AMOR"
Mais uma vez, sem nacionalismo. Foi o nacionalismo que levou ao poder os movimentos ditatoriais, sobretudo do século XX. Foi com nacionalismo que o Ação Integralista se apresentou; os militares se apresentaram. Foi com nacionalismo que mais de 500 mil saíram às ruas na marcha da família com Deus pela propriedade.
E como disse uma amiga, 'com muito amor' tudo bem, porque o amor é cego, agora com muito orgulho...

4. "MÁSCARA V DE VINGANÇA, UMA É 10, DUAS É 15"
Tudo vira produto, venda, lucro.
A arte de mercantilizar a revolução.

5. CONSUMO DE CERVEJAS
Comemoração? Balada? Festa? Animação?
Ah, vá...

6. MOÇA DE SALTO ALTO COM O CARTAZ "PAREM DE OPRIMIR A CLASSE MÉDIA"
Calma, moça, essa não é a pauta e quando for, pode ter certeza que você será o alvo.

7. RAPAZES GRITANDO "VIADINHO" PARA UM GAROTO QUE DANÇAVA
Revolução da opressão? Definitivamente não é aí que eu faço parte.

8. A ONDA DE GRITOS "SEM VANDALISMO"
Realmente estou na dúvida sobre o que estas pessoas entendem por vandalismo. Até subir numa plataforma para fotografar recebeu tais gritos.
Pichações desde a Antiguidade são formas de expressão e oportunidade de visualização para quem transita pelas vias.
A título de curiosidade, nossa língua portuguesa vem de um latim esdrúxulo justamente por ser retirado dos registros escritos da época: pichações em portas de banheiro, placas de cemitérios e monumentos.

9. "O POVO ACORDOU"
Oi??? Há uma galera significativa que manteve-se sempre alerta e nunca dormiu no ponto. Movimentos organizados estão aí na pauta do dia desde há muitas décadas.

10. "VAI TOMAR NO CU"
Para entendermos como somos reacionários com nossa sexualidade e ainda mais em termos homossexuais, uma vez que ao mandar alguém ir tomar no cu, o que se está querendo dizer é que o cara (quando não uma mulher, no entanto a maioria esmagadora de políticos é do sexo masculino) é um "viadinho (para reproduzir o ítem 8) que merece ser comido"
Estrutura patriarcal-machista dá nisso.

11. "FILHX DA PUTA"
Semelhante ao anterior, chamar alguém de filhx da puta com o intuito de desqualificá-lx subentende-se um preconceito presente em relação às prostitutas

12. CONFORME DESCREVE UM REPÓRTER: UMA MANIFESTANTE VINDA DE CAMPINAS, TÊNIS NIKE E ROUPA DE ACADEMIA (NA DESCRIÇÃO DELE), AO SER PERGUNTADA SE LÁ EM CAMPINAS A TARIFA DE ÔNIBUS TAMBÉM ESTÁ ALTA, A MESMA CHAMA A AMIGA E PERGUNTA: -QUANTO É MESMO  A PASSAGEM EM CAMPINAS?
Espetacularização dos protestos. Síndrome de participação evasiva. Exposição midiática.

BÁRBARA ESMENIA - 19/06/2013






sexta-feira, 14 de junho de 2013

AINDA SÃO TEMPOS DE GUERRA

É grito, é guerra, é multidão -
O fogo da justiça parado, em choque.

Trânsito havia; inevitável -
com outros ares, mas era trânsito.

Trânsito de carros disparados?
Não - disparados neste dia foram outras composições.

Trânsito de civis nas bicicletas?
Que nada - civil no sentido de civilização neste dia era palavra inexistente. 

Trânsito de pernas subindo os degraus dos ônibus?
Nem pensar - o que subiram foram as bombas de gás lançadas ao céu.

Não era o trânsito tendo como protagonista a matéria,
a construção linha de montagem de uma fábrica de transportes.

Não, naquele dia era trânsito de pessoas que transitavam -
exercício de cidadania transeunte por pouco praticada.
Em bloco, porque somos melhores no coletivo.

Ninguém ouviu quando a sirene tocou,
apenas o olhar para o lado e o choque na cara do povo.

Nem tempo houve para que a resistência se armasse.

A covardia se apresentava em forma de máscaras, capacetes, garras, escudos, cassetetes, motores, camburões, cavalos, balas de borracha e bombas de gás

A violência-instintiva,
a violência-desgarrada,
a violência-bode-expiatório,
a violência-desejo-mimético,
a violência-vontade-de-ser-o-opressor,
a violência-coleguinha-vamos-brincar-de-polícia-e-ladrão,
a violência-toma-uma-arminha-de-presente,-filhinho,
a violência-o-que-você-quer-ser-quando-crescer,
a violência-seus-putos-bando-de-baderneiros,
a violência-estou-provando-que-sou-macho,
a violência-só-estou-fazendo-o-meu-trabalho,
a violência-puro-prazer-eu-bato-mesmo

(momento apofático)
a violência que não se explica,
a violência não hermenêutica,
a violência não eucarística,
a violência que não traz o novo e faz relembrar que somos bárbaros.

[é sempre ela, a barbárie, a nos recordar o processo ideológico]

Uns olhos vermelhos ao meu lado -
meio assustados, meio esperançosos -
me lembravam que ainda vivíamos.

Com esforço, consigo esboçar um sorriso:
-Sim, estávamos vivas e semana que vem tem mais.
Semestre que vem tem mais.
Em dez anos tem mais.
A vida toda tem mais.

A soma de um povo é que efetua este MAIS.

Ainda vivemos.

MAIS.


(sensações pós-quarto ato contra o aumento da passagem, SP, 13/06/2013)


sexta-feira, 7 de junho de 2013

GUSTAR DA FRUTA

Era tempo de sair por aí
Tempo livre das trepadeiras

Andávamos à beira das ruas desafiando carros,
cortando esquinas,
pulando faixas

Você não sabia muito bem o que fazer
com aquilo que chamavam de existir

É

apenas ser - é isso: É

Posta vida aventurosa
- durada de longos instantes -

Tu na desconhecença do sabor graviola
Eu fingindo rejeitar as sabenças
- idade puer castigando minhas vontades -

A fruta verde a adentrar lábios líquidos
sumo rarefeito possuindo-te as salivas

D'olhar soslaio
de desencontrar frutoses

m'eu segurar de mim
a escorrer desejos

não resistir d'instintos frutiferozes
querer do fruto mordi-mascado

Adentrar da língua gosto
- ignara à procura lâmbida-enlambuzada -

m'entregar às polpas dádivas
riquezas simples de naturar delícias