Hoje é mais um dia
Fincarei meus dedos no chão da minha terra,
Debulharei o trigo,
Colherei abacates nos pés de manga.
É refazenda.
Não se passa um dia sem que eu,
unhas sujas,
não encare Gaia.
Nenhum dia é passado sem que eu,
pés descalços,
não ouça o retumbar de meu peito.
Aqui ecoam gritos de milhares.
Eu, Anita, a carregar as pedreiras do mundo.
Anita-mulher-rocha-sobre-rocha,
a arder num sol que impede
o rolar das águas de março.
O verão não fechou,
As gotas de chuva secaram,
O salário é minguado e o suor de meu trabalho
não trouxe a revolução.
É novo tempo de espera;
Tempo-sólido-pedra-sobre-pedra
Um martelo que bate,
um facão que atravessa,
uma serra que encerra
os limites da mata espessa.
Semi-árido-extra-seco do sertão
(não era este um país tropical?)
De volta o novo dia:
lá estão meus dedos ásperos a arar a terra
-meus dedos móveis enlameados a cozinhar o trigo esparso do jantar
-Pois venha, Joana, venha comer, minha filha
: mesmos dedos passíveis de apertar o gatilho
: guardo em mim o ímpeto rebelião
: por ora, é torcer para que os milicos não apareçam
: e praticar [tiro ao alvo] sempre
: -Quem disse que os donos da terra vencerão novamente?
Nenhum comentário:
Postar um comentário